Cansei de pendurar calendários. Minhas paredes nuas só trazem marcas de sol. Agora sou eu quem faz os dias, lembro que ainda ontem decidi que era o seu. Você gostou e ficou hoje também. Houve um tempo em que eu podava palavras, à espera do momento perfeito, esse impresso em tinta fresca. Mas, besteira, lançar ocasiões para celebrar pessoas. O amor é eternidade limitada, começa quando quer e acaba do mesmo jeito. Declarações que esperam o 12 de junho pecam pelo excesso de planejamento. Bom mesmo é viver instantes, em vez de contabilizar datas.
O tempo é diferente em mim. Antigamente, preocupava-me em reter cada grão de areia antes de deixá-lo escapar. Já não controlo essa ampulheta maravilhosa, deixo que escorra, que leve e me traga. Os meses seriam todos iguais, não fosse nós dentro deles. Essa mania de contextualizar dias é só protocolo. O que conta é aquele décimo de segundo em que se corta a respiração, o arrebatamento da surpresa, a saudade aniquilada. Não é graça de um número que vai mensurar o afeto, se as lembranças acontecem sempre.
Conta-se que nasci há 6938 dias, e vivi 166512 horas. Mas as estatísticas ignoram quantos minutos gastei em lágrimas ou sorrisos sinceros. Dispenso a impessoalidade de vitrine estilizada para definir a época de pensar em alguém. Por amor, crio feriados diários e extrapolo o deadline. Posso até seguir a lógica repetitiva do calendário, mas a minha vida independe dele. Amanhã pode ser a última página, que não seja uma qualquer.