quarta-feira, 30 de março de 2011

Até o fim

Metade de nós, talvez, jamais descubra como é. Se a morte que separa famílias já é dolorosa, imagine perder alguém que se amou por escolha. Depois de meio século de casamento, de repente amanhecer na cama vazia, sem suspiros preguiçosos e abraços amarrotados. Eu conheci um amor que durou até o fim. Nas lágrimas de uma mulher profundamente devastada pelo falecimento do marido, mais do que um sentimento de dependência, eu enxerguei coragem; de amar aquilo que é frágil, e deixar-se viver na esperança de um reencontro. Uma valentia cada vez mais rara.

O casamento deixou de ser um ritual de respeito, mesmo uma celebração de afeto. Como um castelo de areia, se desfaz ao mínimo toque. De obrigação, evoluiu para contrato, facilmente revogável por qualquer uma das partes. Não se sabe razão para insistir em imperfeições, a tolerância já não cabe no mesmo teto, qualquer deslize é motivo para fazer as malas. Mas a glória do vestido branco e das festividades pirotécnicas, ninguém dispensa. Nenhum compromisso é fácil de cumprir. Um que promete o infinito, então, está além da capacidade emocional de uma cultura que só exercita o desapego.

Problemas surgem e, às vezes, o inevitável acontece. Uma máscara que cai, outro sentimento sufocado por falta de zelo. Não é justo obrigar ao convívio casais de cera, perfeitos na teoria, frios ao toque. Mas se o amor não é forte o bastante para sobreviver ao mau tempo, dificilmente merece dividir o mesmo barco. Aprender a ceder deve ser o primeiro passo de quem pensa em se casar. Sem a disposição para fazer pequenos sacrifícios, a ruína é previsível. Qualquer relacionamento acaba, não existem vírgulas eternas. O final mais feliz é ficar junto, até que a morte, e somente ela, os separe.

quarta-feira, 23 de março de 2011

Chique é ser estrangeiro

Se acaso a existência de extraterrestres fosse comprovada, provavelmente o primeiro lugar que eles escolheriam visitar seria o Brasil. Afinal, em nenhum outro país os forasteiros são tão homenageados. A recente visita do presidente dos Estados Unidos demonstrou todo o potencial da hospitalidade brasileira, com direito a criancinhas vertendo lágrimas e o Cristo Redentor inteiro para a família real. Cada passo do grande Imperador foi anunciado com estardalhaço, minuciosamente planejado, para que tudo fosse perfeito e adequado. Não parecia a chegada de um simples Chefe de Estado, mesmo que o maior. Aqui, Obama foi rei.

Fonte: O Globo


O mundo inteiro reconhece a ascensão econômica do Brasil, mas um país que não sabe comportar-se como gigante sempre será um anão de mentalidade encolhida. Ao contrário da China, nação mundialmente respeitada que enfrenta seus problemas de liberdade política, mas carrega em sua cultura milenar a dignidade e o orgulho; neste país o reconhecimento só é válido se vier de fora. Celebridades internacionais são ovacionadas, encontram Pelé, abraçam a Presidente ou são hospedadas por Luciano Huck e Angélica. Os brasileiros são os melhores anfitriões do mundo. É uma pena que, lá fora, não recebam a mesma cortesia.


Ashton Kutcher e Demi Moore na casa de Angélica e Luciano Huck, em Angra


É vergonhoso esse tratamento supervalorizado, se a necessidade de provar como o país é lindo e desenvolvido é maior que o investimento real em infra-estrutura e educação. Ainda mais constrangedor é notar que os brasileiros enchem de regalias os visitantes ilustres, mas são cheios de preconceitos contra os seus mais corajosos irmãos que, longe dos resorts e das praias paradisíacas, sofrem as mazelas de um outro Nordeste. Ser gentil e hospitaleiro não justifica agir como criaturas inferiores, sedentas de aprovação. Nada, no Brasil, é melhor que o brasileiro, embora ele freqüentemente se esqueça disso. Longe de afirmar-se como potência de dimensões culturais muito maiores do que futebol e samba, a postura do país permanece curvada, reforçando seus piores esteriótipos. Não dá para ter respeito por uma nação assim.

segunda-feira, 14 de março de 2011

Comunique-se

Pense duas vezes, antes de falar. Mas não se cale para sempre. No fundo, não se trata de podar palavras, é apenas uma questão de saber dosá-las. Quem fala demais magoa sem querer. Se o silêncio persistir, no entanto, nada ficará a ser dito. Embora a necessidade de procurar medir nossos pensamentos antes de verbalizá-los seja inquestionável, reprimir idéias é censurar a si mesmo.

Curiosamente, todo mundo precisa de duas coisas: voz, e autocrítica. A coragem para dizer, com coerência, porque quem fala sem cuspir insultos é escutado, e uma boca cheia de opinião não engole mentiras. E autocrítica, para perceber a diferença entre se expressar e cair no ridículo.

Se o que estiver na ponta da língua for um elogio dado de bom grado, liberte, mas se for uma ofensa de má fé é melhor secar a saliva envenenada antes de contaminar alguém. Todos os dias, é preciso exercitar um pouco de diplomacia pessoal. Só não vale ser camaleão, mudar o que diz de acordo com quem escuta. Ou ficar em silêncio, por medo de represálias. E se ninguém puder ouvir?
Bom, para isso existem blogs e twitter.