Eu odeio o tempo, esse carrasco da disposição cheio de promessas vagas e auspiciosas. Detesto, sobretudo, a maneira como sempre ansiei por ele – e de repente quis anular sua chegada. O velho senhor costurou os milhares de rasgos que eu trazia na alma, a troco de novas feridas e um presente para se alojar. Caminhou pelos meus dias e criticou a minha pressa. E eu percebi que aquela figura impassível que todos me pediam para esperar, nunca sequer foi embora.
A rebeldia que aos quinze atrapalhava, se a vontade não cabia no corpo, fez falta. Agora que posso sair quando quero, as esquinas já não me recebem tão bem. Na casa sem gosto de lar, só cheira a comida estragada, palatável a goles de cerveja. Descobre-se que roupas de cama precisam ser renovadas, e contas não se pagam sozinhas. Que fina ironia essa das horas que convocamos no desespero, e se anunciam sem espetáculo. O querer mais forte desaponta.
Meu detestável companheiro zomba de tamanha ansiedade, sua imprestável comitiva de frente. Aponta-me os espelhos, mostrando com orgulho suas pinceladas mais firmes, que depois de secas ainda escorrerão. E eu aqui, me desdobrando em novos planos, sem viver os segundos que ele traz na manga. É um camarada sagaz, suas notícias de ontem sempre guardam aprendizado. Na verdade, já sei até porque os mais velhos sempre me recomendaram paciência quando se tratava desse hóspede desagradável: É que de tantas maneiras procuro ser feliz, que não notei que já sou.