Você escreve. Desde criança, constrói ficção. E parece que, de uma forma ou de outra, quando viram palavras os personagens não te pertencem mais: fogem para as linhas, agora são do mundo. Paulo Coelho, esse pseudo-cultista-escritor-bruxo que nunca admirei, mas cuja sagacidade momentânea me fascina às vezes, postou em uma de suas redes sociais que “o livro se escreve por si só. O escritor apenas digita as palavras”. Devo admitir, projeto de autora que sou, que não decido o destino dos meus personagens. Eu apenas digo as palavras mágicas que os fazem surgir. Sou Deus sem onipresença.
Tem esse cara, por exemplo, me surgiu pronto na mente. Mas eu quero que ele seja algo e, de repente, lá está ele, trilhando seu próprio caminho. E eu digo: ei, pare por ai amigo, eu defino onde você vai estar! Não tem jeito. Eu não sei de nada. As ideias escorregam e de repente um roteiro pronto de vida está traçado. Juro, da primeira linha ao resto, é como se alguém sussurrasse o que vem depois. Por isso o silêncio, por isso a concentração.
Eu dou a luz todos os dias a filhos que morrem na gaveta. E esses filhos, que consumiram tanto de mim, não são meus. A criação é o ato majestoso de desapego.